quinta-feira, 14 de outubro de 2010
O Queijo e o Antropólogo - provocações de Otavio Velho
Uma passagem memorável do livro Besta Fera - Recriação do Mundo do antropólogo Otavio Velho
"No começo da década de 70, eu fazia pesquisa no sul do Pará, na região do Tocantins-Araguaia. Um dia, andando a cavalo por uma trilha no meio da mata, encontrei uma cabana. Na cabana encontravam-se a mulher do dono da casa e diversas crianças. Ao me aproximar e cumprimentar, perguntei se podia beber água. Convidado, apeei e entrei. Sentei num banco e rapidamente chegou a água (barrenta) e, junto com ela, um "queijo" local. Cerimoniosamente, não só bebi a água, mas também comi o queijo, lentamente e com grande dificuldade, sob o olhar da mulher e das crianças, todos enfileirados e de pé à minha frente. Terminada essa prova de estoicismo antropológico de que só os neófitos são capazes, agradeci e me dirigi à montaria, quando fui então interpelado pela mulher:
– Moço, posso lhe fazer uma pergunta?
Um tanto surpreso com essa quebra do típico e tímido silêncio anterior, respondi que sim, ouvindo então:
– Isso que o senhor comeu, isso é queijo mesmo? (Velho 1995:176)."
FONTE:
VELHO, Otávio. 1995 [1987]. "O cativeiro da besta-fera". In: Besta Fera — recriação do mundo. Rio de Janeiro: Relume-Dumará. pp.13-44
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Excelente passagem! Dá para fazer um livro de gafes em campo.
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