Aluno(a) de Licenciatura que já fez bacharelado deve fazer a monografia novamente?

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Entrevista com Bruno Reis


SBPC: Bruno Reis analisa impacto do Reuni sobre as ciências sociais
terça-feira, 27 de julho de 2010, às 7h37


Membro da Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP), o professor Bruno Reis, do Departamento de Ciência Política da Fafich, participa nesta terça-feira da mesa-redonda Ciências Sociais no Século XXI – Interdisciplinaridade e outros desafios. Ao lado da coordenadora da mesa, professora Alice Resende de Carvalho, da PUC-Rio, e dos cientistas sociais Celi Scalon, da UFRJ, e Carlos Alberto Caroso, da UFBA, Reis abordará temas que impactam a evolução das ciências sociais no Brasil.

Entre eles, o advento do Reuni, que favoreceu a proliferação de cursos da área Brasil afora. “Embora assentado em propostas interdiscipinares, os cursos criados sob a chancela do Reuni acabaram ampliando a fragmentação disciplinar”, analisa o cientista político da UFMG, nesta entrevista ao Portal da UFMG, na qual também fala sobre o papel que a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs) deve exercer nesse novo cenário. Reis também questiona o tipo de formação que o jovem brasileiro recebe no ensino médio. “Nossa escola é obtusamente científica”, critica.

Como avalia o atual cenário das ciências sociais no Brasil?
As ciências não pairam sobre o nada, resultam de uma história institucional. As ciências sociais, por exemplo, cristalizaram uma identidade específica em torno da ciência política, da sociologia e da antropologia. Não se trata de um agrupamento comum mundo afora; é uma particularidade brasileira. Os Colleges nos Estados Unidos não têm o grau de especialização e profissionalização de nossas universidades. Lá, um aluno que ingressa em um college de ciências humanas cursará uma série de disciplinas até descobrir os seus interesses. Nossa história é diferente, envolve diplomas específicos, cursos separados, área de humanas fragmentada. Às vezes, os nossos bacharéis se sentem em vantagem em relação ao aluno que acabou de sair de um College americano. Nosso modelo pode até produzir uma vantagem inicial, mas a longo prazo pode se transformar em uma desvantagem. Acho que, aos 50 anos, um profissional de ciências humanas se beneficia de ter uma base de formação mais larga, algo que é favorecido pelo sistema americano.
Voltando ao Brasil, as ciências sociais mantiveram, de certa forma, um guarda-chuva relativamente largo para três especializações: ciência política, sociologia e antropologia. Mas é um agrupamento relativamente arbitrário, uma configuração resultante da própria história das ciências sociais no Brasil e que se consolidou com a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), criada em 1977. O que ocorreu é que, aos poucos, as pós-graduações no Brasil se consolidaram em torno de matrizes disciplinares e, à medida que se institucionalizaram, elas passaram a se reportar a associações disciplinares, como a ABA (antropologia), SBS (sociologia), e a ABCP (ciência política). E de forma não intencional vem ocorrendo relativo esvaziamento da Anpocs, que, cada vez mais se firma como polo de referência para os alunos dos cursos de graduação, os quais ela formalmente não representa.



O que deve ser feito para reverter esse esvaziamento?
Mais do que resistir, sustar ou combater esse processo, acredito que a Anpocs precisa se apresentar como uma associação multidisciplinar, capaz de expandir sua interlocução para além das três áreas. A melhor maneira de robustecê-la é investir em uma identidade transdiscisplinar na área de humanas. Há uma série de indagações sobre o futuro das ciências sociais no Brasil relacionado com a questão da relativa afirmação autônoma das três áreas e do esvaziamento da Anpocs à qual me referi anteriormente. E há também o fato de o Reuni ter aprofundado esse processo. Embora assentado em propostas interdiscipinares, os cursos criados sob a chancela do Reuni acabaram ampliando a fragmentação disciplinar. Veja o caso do curso de Gestão Pública, criado na Fafich. Como o DCP assumiu a iniciativa de estruturar o curso, ele acabou ficando com uma carga horária de disciplinas de ciência política maior do que seria o ideal para um curso de gestão pública. Do ponto de vista institucional, isso criou um problema. Há muitos cursos novos surgidos com o Reuni e certa inquietude quanto à administração deles: a ciência política tem um pé nas ciências sociais e outro na gestão pública; a antropologia na UFMG é, ao mesmo tempo, um bacharelado e uma ênfase de outro bacharelado. Há quem diga que isso não é problema, mas certamente existe uma duplicação de recursos, com riscos de evasão adiante.

Quantos cientistas sociais o Brasil forma por ano?
Não sei, mas o que posso dizer é que eles constituem uma paisagem muito diversificada. Levantamento da ABCP realizado há cinco ou seis anos mostrava que o número de disciplinas de ciências políticas nos cursos de ciências sociais era muito pequeno. Ou seja, essa tríade antropologia-sociologia-ciência política é meio que para constar. Há cursos de ciências sociais, sobretudo no interior, que estão preocupados em formar professores de sociologia para o ensino médio – o que é compreensível. Eles incluem disciplinas básicas de sociologia, do pensamento político clássico (Maquiavel, Hobbes, Rosseuau) e só. Por outro lado, não há consenso entre nós, cientistas sociais, do conteúdo de sociologia que deve ser ministrado no ensino médio. É preciso cristalizar uma certa ciência aplicada para o ensino médio. Em outras ciências, como na Física, isso já está resolvido. Um aluno do ensino médio não é obrigado a ler um artigo de Einstein sobre a Relatividade Restrita. Ele vai simplesmente se debruçar sobre um compêndio com os principais resultados de determinada experiência científica e não sobre a história da reflexão.

Como os alunos do ensino médio têm chegado à universidade?
Acho a escola excessivamente precoce e ritualística. Na verdade, preferiria receber um estudante do ensino médio com menos carga horária de ciências, mas com desenvoltura em segunda língua, com mais base em matemática, tocando um instrumento musical, lendo uma partitura. Enfim, que aqui chegasse um aluno melhor formado cognitiva e culturalmente, para que, a partir daí, a universidade pudesse profissionalizá-lo. O que ocorre, muitas vezes, é o oposto. Chega um menino com muito conhecimento técnico-científico, mas sedento de formação filosófica-humanística.

Há quem diga que o Brasil forma muito mais cientistas sociais do que pesquisadores nas áreas de tecnologia e engenharias. Esse debate preocupa os cientistas sociais? Isso é real ou é preconceito de quem não coloca as ciências sociais e humanas no mesmo patamar das ciências, digamos, mais clássicas?
Acho que tem um pouco de tudo do que você sugeriu. Todas essas alternativas fazem sentido e não são mutuamente excludentes. Mas não vejo esse debate muito presente entre os cientistas sociais. Normalmente, a gente se preocupa mais em discutir se estamos formando bem do que se estamos formando muito ou pouco. E não há muito o que a universidade possa fazer sobre isso. É uma demanda que ela recebe da sociedade.

É um debate com viés economicista...
Mas é pertinente. Um país precisa pensar no tipo de profissional de que precisa para se desenvolver. O Ministério da Educação, por exemplo, não só tem o direito como a obrigação de refletir sobre isso, de avaliar se as vagas que ofertam em seus cursos são coerentes com as demandas do mercado de trabalho e com as necessidades estratégicas do país. Se há uma distorção na demanda, é possível que a explicação esteja naquilo que eu disse anteriormente. Se a escola conseguisse resolver a curiosidade humanística das nossas crianças e jovens, eles talvez procurassem depois, com mais segurança, um curso de engenharia. A escola é obtusamente científica. Minha intenção é formar cientistas aqui na Fafich e acredito que a minha tarefa – e também a do professor do ICEx ou do ICB – seria paradoxalmente facilitada se existisse menos ciência – no mau sentido – nos ensinos fundamental e médio. Melhor seria se houvesse mais matemática e menos esforço de memorização de fórmulas das várias ciências e taxonomias biológicas. Elas não ajudam a formar cientistas, porque induzem os jovens a aceitarem dogmaticamente um conhecimento como dado.


FONTE http://www.ufmg.br/online/arquivos/016241.shtml

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